8 de julho de 2019
Divindade
Medo de mudança, daquilo que é novo
me sinto um primata descobrindo o fogo
descobrindo a ausência da combustão
e grito igual um. Não sou deus de meus comportamentos,
de meus pensamentos, de minhas intenções.
Sou um X na imensidão de variáveis, só um X.
E essa sensação de tudo controlar, de tudo
estar ao meu alcance. Não altero o tempo.
Não altero os calafrios e rios dos olhos.
As navegações e as cruzadas dos meus dias.
A cruz que carrego (leve) e parece doer.
Tudo. Tudo isso se esvai num momento,
o próprio drama dos versos, desaparece
como que se nunca tivesse existido; e lutar
contra o óbvio é o que mais fazemos.
O baixo astral que escreve as manhãs pausa
no gole amargo do café, que deixa viver.
O que quero para hoje - posso pensar - o que quero?
Decido por nada querer. Espero pacientemente
as coisas se resolverem.
Me noto sendo um observador dos meus gestos.
Noto que me evito. Noto que me estrangulo.
Noto que a felicidade é fingimento que machuca.
Noto que aquele rock pesado, não mais me agrada.
Noto que dias intensos não possuem sentido.
Por quantos segundos o espelho encara?
Por quantos segundos suporta se notar?
Por quantos segundos?
E a solidão, por vezes, é uma dádiva, uma companheira,
que ensina com método próprio.
Basta aprender a conviver consigo próprio. Paciência,
deus é o tempo. Não é substância, criador ou criação.
É o tempo. O conceito mais absurdo que o homem
permitiu conhecer.
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