30 de janeiro de 2016

Um momento

Só por um momento
queria não ouvir
qualquer ruído, qualquer a ou b,
só por um momento;

Acordar, tomar meu café,
e, depois, ao entrar no ônibus
notar que não há ninguém.
Nem o chofer nem os passageiros
daquela lata de sardinha.

Só por um momento
queria não querer
nem querer-te nem querer-me,
queria não saber
o tanto que deveria saber
o tanto que sei
e o tanto que nunca saberei,
queria não saber da minha ignorância,
tampouco escutar elogios. Críticas menos ainda.

Só por um momento
queria  não ter que ver
nem sentir. Nada por completo.
Só por um momento
as estrelas seriam tudo que eu precisaria,
seriam paz e poesia
no meio da selva.

Só por um momento
nada de prédios, tédios ou remédios,
nada de tecnologia, byte ou canções,
nada de sons, imagens, ou vozes,
nada de ego e id, só por um momento
eterno momento, enigma.

29 de janeiro de 2016

Cordial

Verbo açucarado
cordialmente na poesia
venha ao meu lado
dizer que a vida é
vazia,

noites brancas, doce
como mel sobre mel;
que a vida antes fosse
essa poesia do papel,

rimando e  desprezando
a simetria
só para  repetir
que a vida é
vazia!

28 de janeiro de 2016

Verbos soltos

Verbos soltos na página
imagina se aquela estrela
me deixa assim cadente,

e, louco para vê-la
acabo por ficar, doente.

Que homem não quer fugir
de si e beijar a Lua?
Que ser não quer ouvir
pleno silêncio na rua
e saber, por pura misantropia,
que ninguém mais é.

Verbos soltos no caderno,
sou o que sou, se céu
juro que escrevo inferno,
se tão só nas trevas
desenho café e cevas.

Verbos solto na página
falávamos de estrela e algo assim,
e então nos perdemos de novo
sem início; sem meio nem fim.

26 de janeiro de 2016

Os pés na nuvem

Com os pés na nuvem
e a cabeça no chão
vou caminhando e nem
noto a solidão,
mas ela é vingativa
faz questão de ser notada,
e ela é flor viva
é companhia versada
no silêncio absoluto;

vivo, vidinha de sempre,
o mesmo, que eu me lembre.
Mas sem luto,
sou feliz não sendo feliz todo o tempo,
sou feliz por não precisar sorrir
por poder fechar os olhos e ir
ao inferno.

 

25 de janeiro de 2016

Fiquei olhando, só olhando

Fiquei te olhando
e passou despercebido
aquela frase surgiu
e você veio sorrindo,
poeta filho da trova
e o caos jamais foi lido.

Fiquei te olhando
e pensando sacanagem,
coisa que amando
faço
para não perder a viagem.

Fiquei te olhando,
rima de todo o céu,
e fui notando
que meu sonho
quedou ao léu.

Fiquei te olhando
e só fiquei olhando mesmo,
percebi que homem que ama
sempre acaba à esmo,

olhando, olhando e olhando.

24 de janeiro de 2016

Poesia de haicais

Vento, pó, poeira.
As vezes, tudo
parece besteira.

Fico lendo e penso:
verbos tão cheios
de um vazio imenso.

E isso é só o começo
daquilo que de frente
não passa de avesso.

E isso é só o fim
de um verbo escrito
no pronome "mim".

E isso é só meio
daquilo que escrito
já não leio.

E isso é mais que nada
a vida parece nova
mas, está é cansada.

Vento, pó, poeira.
Repito o verbo
sujeito a mesma bobeira.

22 de janeiro de 2016

10 versos de pincel

Oportunidade. Sinto ares novos, e não são da casa vizinha.
Algo me diz que nada vai dar certo, mas que dessa vez, baby,
irei ao menos me divertir um pouco.

Sinto a adrenalina, que na veia pacata começa a fazer cócegas,
e já é o suficiente para acreditar que tudo vai mudar
e que mude para a pior, mas que ao menos mude. Mudança
por vezes me anima. Só a mudança é eterna, não?

Oportunidade. Cheiro de torta, de vida torta, encaminhando-se.
Torta por querer, torta por ser seu dever assim ser. Torta e tonta.
Ares novos, longe de ser buenos aires, la cosa es mala, pero es.

20 de janeiro de 2016

Ainda não tão sincero

Pra ser sincero, ao pensar a vida
desanimo, nunca fui de muitas palavras
e quando falo é mais por desespero que necessidade
coisa que não entendo, pois gosto do silêncio,
a maior invenção jamais criada.

Tenho que ganhar meu dinheiro, comprar o básico,
pagar além do devido para essa ditadura mascarada.
Tenho que fazer algo e ainda assim ser
ridicularizado por vagabundo, ranzinza, por pessoas banais,
tenho (como dizem), que acreditar e ter fé
nesse maldito deus onipresente, e rezar.

Vão todos para a puta-que-pariu,
com todo respeito, caros leitores. Tenho que ser educado.

Pra ser sincero, trabalho no momento com a tecnologia
mas odeio gigamente todo megabyte, sistema
e aparelhos modernos, educadores de boçais e alienados,
que não sabem ir na rua para saber se está ou não chovendo,
procuram nos seus aplicativos de merda.

Pra ser sincero, já fui tão pouco sincero,
sorri quando queria chorar, calei quando o grito chegou à garganta,
estendi a mão, querendo recuar.

Eis que desprezo o contrato social, mando
alguns filósofos tomarem água de privada.

Pra ser sincero, poesia, maldito refúgio na escuridão,
versos que seriam discussões, brigas e escândalos.

Pra ser sincero, minha garganta arde de sede
mas não lhe pedirei uma só gota d'água.
Meus pés queimam no solo fervente
mas não lhe pedirei sandálias velhas.

Cai a noite, mas o dia
esse sim me parece escuro, sombrio,
e os normais, esses sim me parecem loucos. Absolutamente.

Tomai a vossa razão, é só o que tens.
Bebei do vinho sagrado. Será ainda sagrado na boca da serpente?
Comei dos teus rituais, eis o corpo. Católicos-canibais.
Pra ser sincero, não bateis na porta
se for para pregar a santidade,
em quatro paredes, todos somos diabos
acorrentados nessa quase liberdade, pior que prisão.

Pra ser sincero, ponto final, preciso de um café.

19 de janeiro de 2016

Loucura tem nome

Loucura?
Loucura tem nome
e cabelo ruivo,
riso desesperado e choro
inesperado. Loucura,
que sei sentir falta.

Loucura, que quer sumir,
loucura, com todos os sentimentos.
Loucura
a essa altura
a única
cura.

18 de janeiro de 2016

Essa raça definida (5)

Não revirarei seu lixo ou sua lixeira
não dormirei na porta da tua garagem
não fingirei ser outro a vida inteira
tampouco escreverei poesia na margem.

Cães de raça também moram na rua
e vira-latas as vezes são amados
mas somente e verdadeiramente por um vira-lata.

Cães que somos, condenados ao verbo e vida,
vira-lata-poesia- se vira!

17 de janeiro de 2016

Poesia para a estrela

Estrelas. Elas que tão belas, encanto silencioso,
mostram que nós somos um monte de nada
sem luz, sem alma, sem sentido algum, que
sem querer aconteceu. Por acontecer.

Estrelas, que fico horas observando e desenhando
na mente seus movimentos diários e constantes.
Sei que é a Terra que se move, não necessita me corrigir.
Para a poesia é mais belo dizer que os movimentos são delas,
e o poeta sempre foi de se enganar.

Estrelas. Nenhuma na Gaia. No balaio humano
somente barro e mentiras. Estrelas são eternas.
E meu eterno se limita ao meu existir.
Estrelas são poesias cintilantes desde milhões de anos.
Estrelas são poetas que morreram e não sabem calar.
Estrelas são enfeites natalinos para quem tem os pés no chão.
Estrelas são o que bem quisermos, nós, lunáticos,
pés nas nuvens.

Estrelas, cada uma com a graça, provavelmente não viverei
o tempo de uma só estrela. Meus olhos
estarão com elas algum dia. Meus olhos desprezam as luzes
artificiais. Estrelas, estrelas.
Com tantos prédios e casas
queria um campo vago
para vê-las.

Haicai noturno II

Vem noite. Pois já
Estou estressado.
Ac-alma-me o chá.

Versos para o Caos

O caos, poesia perfeita
feita para ser escrita
em momentos inesperados
em momentos vazios
e cheios, cheios de nós.

O caos, dono do mundo,
do céu, do inferno, da alma,
que queima como madeira. O caos,
cão.

16 de janeiro de 2016

13 de janeiro de 2016

Essa raça definida (4)

Se sou assim, não faço por mal, é o destino
nessa folha de caderno virtual, não sou menino
mas tampouco adulto o suficiente para querer ser
tampouco adulto o suficiente para crescer.

Se sou assim, e te irrita, tome cuidado
não estou fazendo nada de propósito,
estou apenas sendo eu, sendo errado,
evitando rimar a todo momento com tuas palavras.

Essa raça definida, algo muito distinto
da tremenda maioria que perde tempo lendo jornais.

Um gole de café e de vinho tinto
para te animar cairia bem. Para nos animar, talvez.

Pois meu bem, tu és séria demais,
não percebe, ninguém está nem ai,
ninguém dá a mínima para o que dizemos
nem para o que pensamos, tampouco para o que queremos,
eles querem rir da tentativa ridícula de se passar por normal.

Não somos assim e nunca seremos.
Tolo o raro que tem medo de ser.
Tolo o homem que chora por não saber rir.
Tolo o homem que é quem nunca será
e que nunca será quem realmente é.

Tolos. Nós
todos. E todos os nós
dessa raça indefinida.

Essa raça definida (3)

Vira-lata não tem casa
vira-lata tem que se virar
e lamber a Lua inquieta,

vira-lata tem é asa
vira-lata tem que cantarolar
a palavra certa,

tem que ter garganta
e sair latindo miséria,
mas no fim, sempre no fim,
não adianta
riem de quem ri
falando a coisa séria.

12 de janeiro de 2016

Essa raça definida (2)

A vida maltrata
o cão que na rua
se lambe.

A noite arrebata
o dia
então vem a Lua.

A noite é ainda mais extensa
mas, acaba por ser refúgio,
enquanto muitos dormem alguns despertam
e saem do automático,

em vias de ser lunático, talvez,
e como sempre, fervo água
para outro café, para outra poesia
tosca de duas horas,
ou, uma leitura concentrada em livros,
pois ainda existem livros bons
dignos de serem lidos. E estão esquecidos.

Vira-lata, desses que não vivem se dando a muitos,
desses que preferem o sossego que o formigueiro,
desses que querem apenas uma carne para comer
algo para beber, pernas para andar, olhos que não fecham,
alma que se cansa fácil.

Vira-lata, e apesar do apesar, feliz com sua infelicidade,
feliz por ir, feliz por não precisar ser sempre feliz,
por se dar ao direito de ser, apenas ser, um vira-lata
que não quer ser lembrado nos livros de história.

Vira-lata não gosta de foto, vive do que lhe oferece a memória.
E se se esquece, melhor.

11 de janeiro de 2016

Essa raça definida (1)

Vira-lata que se vira, remexendo versos, inventando prosa
coçando palavras e rabiscando trovas.
Fugindo e decifrando haicais, a rima que cala medrosa.

Vira-lata que muitos pagariam uma nota!
Pagariam uma nota para não tê-lo por perto,
para despejá-lo na primeira caçamba, ao dobrar a esquina.

Vira-lata que rumina o desprezível, aquele troço sem importância,
que se contenta com o lixo, ou ao menos
com o que os outros estúpidos cães de marca chamam de lixo.

É, meu caro, esse mundo é mesmo do avesso
e por fim acaba todo mundo num só endereço:
cemitério.

E talvez, para aumentar o mistério
e a miséria de ser humano,
vai ver é só o começo.


10 de janeiro de 2016

Te lembra, amora?

Madura amora
em moldura
seria possível
tudo agora
quedar invisível?

Em baixo da amoreira
eu passei um segundo
e fiquei a vida inteira
observando o mundo, mudo.

Mas agora, nenhuma amora madura
ficará nessa árdua amargura
de não servir para nada.
Que ela seja logo apanhada
tomada pelo desejo da boca
e, que a amora não seja pouca.

9 de janeiro de 2016

Estrelado

Eis que deito
mas quedo e penso

perco dormindo
o luar imenso

uma
estrela
silêncio
intenso.

In tenso, eu,
a rua não
é mais o jardim,
lá fora um luar
de prédios.

Tédios
sem fim.

7 de janeiro de 2016

Tempo para o tempo

Hoje o dia pareceu mais azul, blues novo,
dispersando a rotineira neblina da alma,
e foi gracioso, o riso estava lá, contente
e sem medos. Os olhos, sem mistérios ou segredos,
puramente reais e verdadeiros, se tornaram
estrelas e poesias.

Hoje o dia sem dúvida estava poético
apesar de não ter sido rima, foi obra completa,
obra que as palavras não sabem dizer,
mas foi tão simples, tão leve, tão autêntico,
como tem que ser, sem muita ladainha,
o assunto direto na mesa.

Hoje o dia foi sopro na gaita, acordes imperfeitos
em perfeita sintonia.

Hoje o dia despertou com café
e morrerá com graça
na curva da Lua,
isso porque fiquei na praça
jogando conversa fora
direto na rua.

Hoje o dia, quente e calmo,
fidelíssima; foi um grande dia
dia de ócio, risos e poesia,
coisas tão simples,
que adulto nenhum entende mais.

Falhas e conforto

A vida é mais fácil
sem nenhuma prosa
deixa tudo à mil
deixa morrer a rosa
deixa, a rosa do povo.

A vida é mais bonita
sem nenhuma poesia
sem dormir na poesia
com nada de escrita
sem emergir na amargura
sem tornar (-se) loucura
a cura do universo.

Nem o fácil, nem o bonito,
nem o ideal, tampouco o mito,
a dinamite no ego do verso
explodindo rosas e concreto.

6 de janeiro de 2016

Celeste

Poesia musa celeste
da nudez que seu
corpo se reveste;
queria que alguém visse
tamanha normalidade
em tamanha esquisitice.

Oh poesia na gaveta
quem em ato te cria
desolado na sarjeta?

Oh humano, não ria,
se morrem os poetas
tua vida queda vazia.

Poesia celeste musa
que insano completo
logo a ti acusa
de transformar nuvem
em concreto?

5 de janeiro de 2016

Desde que te perdi (ao estilo Kevin Johansen)

Pássaro de asa aberta
para demonstrar a graça do teu voo,
veja bem se me escuta
na janela que a vida nos oferece.
E veja bem se, ao voar, não me esquece
apesar de não ter tantos motivos para ser recordado.

Pássaro, que deixei na minha gaiola
enquanto cantávamos o hino da liberdade,
mas tampouco eu era livre,
afinal, alguém nessa prisão ousaria cantarolar
independência e autonomia?

Pássaro. Pássaro do meu passado,
bom para ti, não me ter
ao lado.

Bom para os ventos e olhares
da selva humana.

3 de janeiro de 2016

Monumento Versado I

E o símbolo é a prova,
a alma, no fundo
não passa de mera cova
da dor do mundo.

Dor por esse sentimento
que dizem constante
mas dissolve no vento
de agora em diante:
teu sorriso é o símbolo
e teu ser, monumento.


Escrito para uma sorridente alma, brilhante(S.M.).

2 de janeiro de 2016

Dia dois

Dia dois, as promessas
foram apenas detalhes
lampejos de mudanças
que esperarão outra data
comemorativa,

para ser.

Dias dois, e daqui a
um pouco mais de trezentos
etc, etc, etc, dias,
escutarei de novo:
"feliz ano novo".

Feliz, talvez, novo, sei que não.
Feliz, todo ano?
Feliz, poucos os dias.

E eis que meu conceito de felicidade
abrange a inexistência
de muitos que me desejaram
"feliz ano novo".

1 de janeiro de 2016

A galinha ou ovo

Ano novo,
fica a pergunta
sem resposta:
o que veio antes
a galinha
ou o ovo?
a pobreza
ou os diamantes?

veja que beleza:
ano novo
me dissolvo
nas mesmas reflexões banais,

ano novo
tudo segue
igual,
vida
sem sal.

Sempre gostei de limão.