30 de novembro de 2016

Esconderijo


Poeta que finge
é poeta com humor
diz que nada atinge
o seu próprio valor.

Mas fingindo
finge não fingir
e vive fugindo
sem saber
pr'onde ir.

A dor que lhe devora
é a dor do verso rimado
dor que chega a qualquer hora
e faz-lhe sofrer, condenado.

Todo poeta é falso
todo falso poeta é
aquilo que ninguém sabe
e que só no verso, cabe.

Poeta que não esconde
é poeta sem verso na manga,
é poeta que de amor
chora, dança, sangra.

E dos poetas que conheço
esses versos dedico,
fingindo, até cansar
eu também fico.

27 de novembro de 2016

Um ano, ou um século.


(Ela)-

Vai, deixa estar, siga seus passos,
abra mão dos infortúnios causados pela felicidade constante (rotina)
e se entregue aos fortuitos desejos de tua infantilidade masculina.

(Ele)-

Pois, que escolha tenho, entre abandonar-me
ou te abandonar? Não abro de minha essência, ainda que ácida
e amarga, ainda que tosca e inquieta. Mas saiba que te quero bem.


(Ela)-

Sei que voltarás, e, ao ressurgir o verso na tua veia
poeta, e ele irá retornar, pois não se foge do próprio
poema.

(Ele)-

O poema é que corre do autor.
O autor corre do amor.

25 de novembro de 2016

Opróbrio próprio para um ignóbil e um haikai


Desculpem-me a estupidez, a arrogância e os versos sem fim.
Mas tenho que repetir esse meu ridículo lamento.
Alguns se utilizam do diploma, retórica, termo sem fundamento.
Outros fazem do discurso: lírio, rosa, orquídea, jasmim.

Quisera meu discurso não houvesse redundância.
O que declaro por meio dele é a falta de elegância.
O que é típico de poema de poeta de gaveta.
Se esconde, se mostra, a crítica sempre flerta.

De fato estou cansado de palavras tão vazias.
Ditas com efeito, com certo ar de ocultismo.
Beirando a esquizofrenia, graduando meu cinismo.
Enquanto escrevo com calor; obras frias.

Desculpem-me o jeito confuso. E a sinceridade.
Repito, repito, foda-se o discurso de autoridade.
Porque na falta de argumento, se ergue a voz.
E todos viram a cara para o que ocorre após.

É assim, e o ciclo não se inverte.
Criança observa adulto, criança adulto repete.
Manda quem fala mais alto, no grito.
Manda quem se utiliza de discurso bonito.

Se aplaude quem se utiliza de jargão.
Termos complicados, ditos com profusão.
Certo está quem utiliza de retórica incompreensível.
Falando pelo cotovelo sobre algo jamais visível.

De fato estou cansado de palavras tão vazias.
Tão cheias do metafísico, dotadas de conceituação
e idiotização antifilosófica.

Como dito por um docente, ríspido, mas competente:
"tudo isso não passa de masturbação intelectual".


Hegel que o diga.
Vencer desse
Quero ver quem consiga.

22 de novembro de 2016

Versinhos, o lado romântico do pessimista


Quero, compartilhar do teu silêncio.

Não muito dessa vida espero, me contenta
o básico. Amor, alimento, alguns debates,
conversas furadas ou sérias, um café.
Um abraço, um livro, umas cervejas, um ar
fresco.

Teu silêncio compartilhado,
além de alguns dias vagos ao teu lado.

20 de novembro de 2016

Poema sem codinome


Havia desejo nos seus movimentos, e certo mistério.
Mas não apenas no sentido carnal, pois cactos
até abrirem para outros olhos sua bela flor
insistem em conhecer tudo ao redor, nos mínimos detalhes
(oh, de detalhes é que se vive, de detalhes é que se morre, lentamente).

Havia medo. Medo, e ela sabe disso, como ninguém.
Suas palavras, ainda que de terna doçura, expressavam
certa angústia, certo arrepio ao mais leve toque.

Sua boca, carnuda, e suas gírias pouco usuais, apenas
faziam com que a noite ganhasse em estranheza, em anormalidade.
Afinal, os normais são tão secos, tão sem cor, tão nus de graça.
Oh sim, não poderia deixar de repetir, havia certo mistério.
Até mesmo para escrever-te versos, bela dama, necessito de critério.
Jamais poema se escreveria, se não fosse a dúvida e o que não se sabe,
ou o que não se diz, e que em silêncio, se entende.

Mas sabes, não sei se tão bem, ainda que isto vivas,
que a solidão és tua melhor companheira,
e que teus melhores sonhos e instantes são com teus silêncios.
Sei

que procuras em outro alguém
não o que outros procuram.
Sei

que procuras silêncio, para que entendas
tudo.
E olhares, para que se olvide
tudo o mais.
Sei

que queres na presença alheia, a ausência dos teus problemas
por isso vazio me faço, como sou, para que ouças
com certo riso no canto de teus lábios
o silêncio composto equalizado entre as paredes de teu quarto
 Sabes

que querendo, aqui estou,
verso aleatório nesse mundo contraditório.
Sei

e certo mistério.

16 de novembro de 2016

As pernas que passam no centro


As pernas que passam no centro
passam depressa para onde não sei.
Desesperadas, correm rumo
ao objetivo de nossa espécie: nenhum.

As pernas que passam
passam e pasmam com seus reflexos.
Rugas que se olham na vitrine da loja
a idade que nos deixa, perplexos.

Agora pouco, uma senhora
com seus pouco mais de cinquenta
pergunta-me a hora
e passa, como a perna, e se ausenta.

Queria ter respondido
que era hora de refletir
mas cego pós-modernista
só sabe refletir o umbigo
naquela vitrine da loja
do verso anterior.

As pernas que passam no centro
passam no centro do meu poema.
Não que isso seja algum problema.
Mas me é estranho, que pernas tão diversas
possam ser versadas e confundidas
se se observa a velocidade com que passam
no centro.

Prefiro a pedra de Drumonnd,
que fica por aí, no centro,
procurando pernas para ficar no caminho
e ser versada,
sem por quê
e mais nada.

15 de novembro de 2016

Não era para ser

-
A poesia questiona o autor.

Furioso, se revolta,
e termina sua criação
nesse verso.

12 de novembro de 2016

Discurso inútil dos desejos


Nenhum poema vale à pena ser escrito
quando a intenção do autor é tornar
o verso cada vez mais narcísico, bonito,
quando há necessidade de cravar
com palavras, o discurso inútil dos desejos.

Nenhuma poesia é para ser elegante;
quando se quer destruir a diferença
entre uma pedra qualquer e um diamante.
Quando se quer acabar com a crença
na rima, na prosa, nas letras todas.

Nenhum discurso é livre.
A liberdade é o discurso do cego.
E o efeito de suas palavras, a religião,
com que convence quem dormente
vive.

Todo poema corrompe seu criador
bem como todo silêncio se espalha,
ainda que este poema não valha
um só segundo de nossa atenção:
para o próprio criador
é prosa inútil, reles, falha.
 

9 de novembro de 2016

Só o banal é fantástico


Vulgar;

toda natureza
humana
toda hora
todo dia
toda semana.

É essa beleza
que merece
ser admirada.

O simples, o corriqueiro.
Evitando o encanto
pelo moralismo e exagero.

3 de novembro de 2016

Versinhos


Um verso, uma prosa
algo ali que acontecia,
chove, nasce a rosa
nasce dor, amor, poesia.

Outro verso, todo medo,
algo ali que acontecia,
em dois, não é segredo,
se no olhar já se via.

Dois versos, eis a rima,
pecado é não cair em tentação.
Um embaixo, um em cima,
versando se compõe a canção.

Um verso, uma prosa,
na transa, na trança do poema.

Um verso, uma prosa,
eis aqui esse outro, esse outro
esse outro, alheio
partido ao meio, o dilema.