28 de novembro de 2017
"Sentilamento"
sentir:
as vezes, é preciso
as vezes, impreciso
as vezes,
é só dor do siso;
sentir;
só me sinto omisso
a tudo isso
sentir
como outros sentem;
eu, sinto muito
que meus sentimentos
se ausentem
sentir;
sentimento tenho
sentir;
disso, me abstenho.
(usar blusa de frio
quando o vento é congelante
não nos adapta ao frio;
nos acomoda).
O constante
A falácia do espantalho
perambula entre paredes;
morre no meu paladar
27 de novembro de 2017
Sem Cerimônia II
22h37;
um membro da família morre
o toque do telefone é sempre fúnebre
mas dessa vez anuncia: "ele morreu".
O cômico é o egoísmo dos vivos sobre a morte alheia.
Todo mundo muda. Se sensibiliza com o partir dessa para nenhuma mais.
Todos choram.
Em vida, o sujeito não recebia sorrisos.
Era só mais um.
Era só um vivo.
Até que ponto a sensibilidade ao ouvir sobre a morte de um membro da família
é sensibilidade para o morto?
tenho pensado o contrário; é mera questão de se sensibilizar
para não chegar na cerimônia fúnebre sem olhos encharcados.
É egoísmo velado velando o sujeito, velando o tempo e as possibilidades esvaídas.
Ir a um enterro sem o choro e a sensibilidade
é chegar em festa sem presente para o aniversariante.
Ir a um enterro é desenterrar os sentimentos
não por conta da morte; mas por conta dos que ali estão
enaltecendo os familiares mais próximos
(que em vida tendem a ser as pessoas mais distantes do morto).
Não me tira a ideia
que enterro é só um momento
para a família saber quais são
os vivos
e os próximos
candidatos à decomposição.
Mas ninguém nota
que são os vivos
que se decompõem?
Aos mortos, nada cabe.
Não há fim. O morto não sabe que morreu.
Não há no morto qualquer comportamento.
Não há no morto qualquer variabilidade.
Não há no morto quaisquer sensações.
O vazio da morte cabe aos vivos.
A extinção dos comportamentos de um morto
é motivo para o vivo refletir sobre os próprios comportamentos.
E viver mais para si; menos para o caixão.
Todavia. Como toda cerimônia,
a morte e as festividades que a cercam
quase anulam essa reflexões;
servem apenas para manter a tradição.
A morte acaba por ser um mero modismo.
A morte acaba por ser uma convenção.
A morte acaba por ser uma tradição dos mortos-vivos.
26 de novembro de 2017
Poesia de telejornais
Controle remoto da TV
é na verdade, controle imediato;
remoto é o sujeito que a assiste
remoto do controle da própria vida.
25 de novembro de 2017
Sem cerimônia
Do mundo, grande parte
mera cerimônia;
a família dita tradicional, dita cerimônia;
o ensino sem métodos, cerimônia;
afirmar liberdade, cerimônia dupla;
chamar médico analfabeto de doutor, cerimônia;
viver em função de aposentadoria, cerimônia;
a polícia, é cerimônia e coerção;
a igreja, idem.
Gritar com criança berrante, cerimônia;
dizer "uma palmada resolve", cerimônia;
o "bom dia, tudo bem", seguido de pedido ou isolamento, cerimônia.
Continuar essa poesia, cerimônia.
Definição
Gente doida:
gente que nasce
pra ser normal
22 de novembro de 2017
poesia meio espremida
Espremo a laranja
olho o relógio;
espremo a laranja
reflito:
o tempo me espreme
tomo o suco
o tempo
me toma
ávido;
olho o relógio;
espremo a laranja
reflito:
o tempo me espreme
tomo o suco
o tempo
me toma
ávido;
Diminuir-se II
Ostra
é bela
pela toxina
não pela
pérola;
Tartaruga
bela é
pela ruga
que leva
no pé
e por enrugar
o tempo
no passo seguinte
Diminuir-se
Tudo estava tão nublado
menos o céu
20 de novembro de 2017
Autêntico
Quanto do meu comportamento
¿é comportamento alheio?
¿tudo, quase tudo, meio?
variações inconstantes do de sempre
inebriadas repetições do mesmo
como ¿loop no rio de Heráclito?
aliás; liberdade é só termo fajuto
para aquilo que ninguém dá atenção
que são as causas e consequências da ação.
sobre meu comportar-se
comporta no meu ato
do ambiente a catarse.
tudo é determinado;
se chove, chovo,
se tem água, nado.
mas nada é fatalismo
isso é diferente, Che;
é teleológico; ilógico.
voltando; ¿quanto do meu eu
encerra no meu, o que é seu?
se há o bom, sou com ele
se há o mau, sou com ele
mas não sou como eles.
Lavar as mãos para o que acontece
não faz o que ocorre, deixar de ocorrer.
Apenas tampa a visão do que já cego é.
Aí vão dizer de liberdade, do caralho a quatro,
e vão te consumir, te desgastar, com a ignorância do não querer saber.
Se morro, meu comportamento vive
no ambiente em que vivi;
se vivo e em vida, morro constante
sou inútil, sou miséria, sou bigato,
e não mereço o solo em que piso.
Se somos nossos comportamentos
ao menos assim, respiramos em paz
copiando de maneira autêntica
o que aprendemos; o que lemos; o que até mesmo, comemos.
Amém.
Acto
se
tudo quanto possível
impossível for
cacto não poderia
ter mais bela
flor
Diminuir-se-possível
o mundo estava meio
olhei para o semáforo
estava amarelo;
o mundo estava; leio
um livro do Skinner
estava radiante;
o mundo; veio
aos meus olhos
¿sou mundo também?
o; velho
ao meu lado
sou eu amanhã
;
¿?
16 de novembro de 2017
Haicai meio pêssego
Antes o azedo, amargo;
estando doce
um passo para a podridão.
Ditando
Antes pensar na morte que ela em mim
Crônica I - "De toda forma, prossigamos"
Nem sei bem, caro leitor, se o que escrevo é o que ocorre; mas escrevo esse emaranhado de cotidiano de uma guria qualquer.
Ela desperta, as cinco da manhã. Tem família - como qualquer outra - talvez uma filha pequena que vai para o colégio, logo cedo, zumbizinha; talvez um marido que apressadamente luta pelo pão do dia seguinte, e não tem tempo nem para tomar o café da manhã do próprio dia. Tem família - como qualquer outra que não se anda tendo hoje em dia; e isso não é algo ruim, devido as circunstâncias do meu escrever.
De toda forma, prossigamos. As cinco, desperta: arruma a mesa, arruma a casa, arruma a roupa de todos, arruma o almoço, arruma as camas, arruma, arruma; são seis horas. Toma o ônibus; o ônus do povo; o bônus é estar cheio.
Chega no seu trabalho, ou por melhor dizer, o trabalho a ela chega. Uma pequena fila, antes mesmo das sete horas, a lhe ofuscar o pensamento. Zumbizinhos. Mas tampouco eles tem culpa de ali estarem; estiveram apressados pela madrugada-manhã, não possuem pais que lhes façam o café (sim, leitor, possuem mãos para fazê-los), apressam-se para sair de casa, e como a burguesia, além de pressa, tem money, não se preocupam em comer em suas residências: tomam o café da manhã nos quinze minutos antecedentes as aulas; afogam-se em salgados, pães e, principalmente, na amargura esplêndida do café. Sim, o Café. O motivo da fila; o motivo do despertar as cinco da guria que estamos comentando; o motivo dos atrasos em sala; o motivo de diálogos fervorosos entre adolescentes e suas besteiras filosóficas; o único item que se pode comprar - o copo, claro - com uma nota de dois reais, antes da manhã chegar.
Ela chega a sua servidão; apronta-se: põe vestimenta, põe sapato específico, põe toca de cabelo; põe seu corpo em hibernação; e ativa o sistema de trabalho.
Aí daqueles que não conhecem o sistema de trabalho. O magnífico sistema de trabalho acoplado ao corpo de todo ser humano que precise escravo ser. Ela o ativa. Seus sentidos somem; os robôs sentem inveja da mecânica dos seus movimentos; e ela se locomove, com os olhos entreabertos, como se nada estivesse acontecendo, como se ela não tivesse que passar as próximas dez horas em pé, servindo ignóbeis alunos e professores de faculdade - além de visitantes curiosos - servindo sua própria cova, se entorpecendo com o cheiro de cafeína e açúcar; além da canela (e o som das abelhas, por consequência), as vezes.
Tudo isso, meu caro leitor, minha cara leitora, minha outra face. Tudo isso, para chegar no início do mês seguinte e receber seus míseros mil reais; o suficiente para comprar 500 copos de café que o local em que trabalha vende.
Ela abre a loja, e as pessoas da fila dizem, como se estivessem em uma Assembleia, como se estivessem numa Doutrina Esquizofrênica, ou como chamam por aí, nas Igrejas. Dizem: "Aleluia".
E pensam vocês que ao ouvir essa exclamação a guria em questão se incomoda? Não. Ela diz "bom dia", ela recebe "bom dia". Ela está com o Sistema de Trabalho ativado. Não tem sensações. Ali não habita um ser humano nas próximas dez horas (ou mais, quem sabe).
Ela termina o expediente na loja, já sem pessoas na fila, e diz, como se estivesse em uma Assembleia, como se estivesse numa
Doutrina Esquizofrênica, ou como chamam por aí, nas Igrejas. Diz:
"Aleluia".
O engraçado é que com certa frequência ela não mais usa o Sistema de Trabalho. Ela é o trabalho. As pessoas a olham, sempre sem qualquer expressão ou humor, e comentam: "olha, é a moça da cafeteria, o que ela faz aqui?". Claro, ela não pode estar ali, ela é o trabalho. Operários não vão ao mercado. Operários não tomam cerveja. Operários não dormem. Operários são seus trabalhos, são suas funções. Mas, interrompendo nossos delírios filosóficos, voltemos a crônica.
Ela desperta, as cinco da manhã. Tem
família - como qualquer outra - talvez uma filha pequena que vai para o
colégio, logo cedo, zumbizinha; talvez um marido que apressadamente luta
pelo pão do dia seguinte, e não tem tempo nem para tomar o café da
manhã do próprio dia. Tem família - como qualquer outra que não se anda
tendo hoje em dia; e isso não é algo ruim, devido as circunstâncias do
meu escrever.
O leitor pode estar se perguntando: oras, mas vais repetir a crônica?
E, ao acaso estou eu repetindo algo? Tomai conhecimento que, da minha parte, não repito nada. Estou descrevendo, minuciosamente, o amanhã da guria em questão. Mas, se não consideram necessário, me calo, me calo.
15 de novembro de 2017
Muito obrigado I
O "muito obrigado" tem valor egoísta
ou não tem valor algum.
Numa loja de fast food qualquer, digo boa noite,
como quem nada diz;
digo, por favor, como quem nada sente;
digo, muito obrigado, olhando nos olhos,
sem esperar o menor sinal de vida
apenas um - de nada, fique a vontade.
Vontade.
Numa loja de fast food, o desejo
é imediato.
10 de novembro de 2017
museu dos meus p (r ) o (bl) emas
"te olho, sei que por instinto
me olha, tem algo ali!
Selvagem, gigante tu, guria,
tuas minuciosidades e detalhes
teus lábios,
faz crescer
a intenção
e a tensão
o tesão
a atenção
no segredo dos teus olhos,
como aquele filme do Darín,
devoro-te, devoto-te, decoto-te, decoro-te, coro-te;
devoro-te!"
9 de novembro de 2017
Quinta feira-di-versá
poesia
de
pendência
pingo d'água
lembra verso
nuvem passa
lembra verso
a Paula falando de reforçamento e frequência
com jeitinho francês de ser
lembra verso.
ex
cedo
na tarde da madruga
o que se deve pensar
e não dorme o organismo.
lá fora, coqueiros
se reconfortam ao vento
mexem, mexem, mexem
Lembra verso.
Mas não tem floresta
só coqueiros.
Ainda lembra verso,
mexem, mexem, mexem.
7 de novembro de 2017
Introdução ao contexto
deixai o enigma do entendimento para os que leem
os escritores só rabiscam e deturpam versos
não são coerentes, nem querem assim; a maestria
das frases de efeito que o diga, o verbo arremessado
cante aqui o que tendo dizer.
deixai os sonetos e a contagem de sílabas para gramáticos
os que inventam ordem no caos;
os escritores são dementes, clementes por imediatez
ficam a brincar com algo tão seco de vida.
deixai os questionamentos para os epistemólogos,
as análises de conflitos internos inventados para os psicanalistas
as lamúrias para o funcionário público,
as dores da profissão para os docentes doces inocentes,
a poesia é, somente e para, controle.
Sim! Pensais, tolo, que as estrofes não são para controlar,
desviar opiniões, convencer-lhes?
Que o objetivo tem o escritor que não o de manipular
suaves olhares? Para que os efeitos, feitos e enfeites?
Enquanto comentam a política, enquanto discutem o clima,
enquanto analisam variáveis, enquanto sustentam hipóteses,
enquanto defecam, dormem, riem, choram, sufocam, falam;
lá está o escritor! Lá está, a lhes observar, dominar, dando-te forma,
manejando com controlada aleatoriedade as palavras que fincarão
a estaca versada no teu comportamento.
E se perguntarão o significado daquele poema...
6 de novembro de 2017
correnteza
sensibilidade
pra olhar ao redor
e ignorar
5 de novembro de 2017
clichê che
Alguns amigos meus
acreditam em deus
Outros, acreditem,
creem na democracia
gargalhadas.
4 de novembro de 2017
Verte desde afuera (o algo así)
sensação estranha
parece tudo tão bem
mesmo com as pessoas
mesmo com as palavras
desabando,
indiferença, talvez;
tô numa condição de ócio
com tanta tarefa pra fazê
e fico cá, escrevinhando
caminhando versos
pisando rimas e cerveja
comendo rúcula, tomate-cereja.
sensação estranha
deve ser a paciência e o silêncio
alimentada pelo xadrez
...
foda é que em toda guerra
tem quem ignore a bandeira de paz
foda é que para os outros
é difícil compreender a indiferença
com o mercado de peixes
...
sensación rara;
es lo que peor llevo
la sensación de estar fuera
de lugar.
Como si estuviera
dentro de un video juego
...
3 de novembro de 2017
meta -linguagem
preciso é
reinventar a roda
todos os dias
pra não morrer
quadrado
quadrado quadrado
quadrado quadrado
quadrado quadrado
quadrado
tô, mate!
Tô mate hoje
meio xeque-mate
meio sem crédito
com o bispo
com a rainha
com o rei
tô, mate
daqueles cereja
pequeno
que tem sabor
de terra
feito por peão
tô mate
mais pra chimarrão
que pra café
coisa do clima né
interior de são paulo quando tem nuvem
é pó pra todo lado
ficar o tempo todo na defensiva
pra proteger um reinado que não é meu?
tô, mate, tô, com preguiça de xeque-mate
com preguiça de cozinhar.
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