*Texto retirado do Blog: Meu Verbal
Bolsonaro é o candidato mais bem adaptado ao que eu creio ser o futuro
das campanhas políticas. O candidato do PSL provavelmente sob orientação
de Steve Bannon soube se aproveitar com maestria da natureza das
interações em rede, que hoje em dia chegam a ocupar uma boa parte de
nosso tempo. A questão é que não se trata mais das mesmas regras de
quando as mídias tradicionais tinham monopólio da informação sobre os
candidatos, a informação hoje circula de modo diferente e para que
possamos entender como o candidato tirou proveito disso devemos antes
entender o que as redes sociais trouxeram de novo.
A TV tem por objetivo oferecer um produto que garanta a audiência do
telespectador, quando se trata da TV aberta os telespectadores formam um
grupo amplo, já nos canais da TV fechada os telespectadores formam
grupos reduzidos. Tanto a aberta quanto a fechada modelam aquilo que
emitem de acordo com o feedback fornecido pelos seus telespectadores, um
programa é cancelado quando tem pouca audiência, notícias polêmicas,
que são garantia de audiência, inundam nossos televisores, o único poder
que tem o telespectador (se é que tem algum) é o de continuar
assistindo ou não. Aqui é importante notar que o cidadão não tem um
papel de emissor e/ou criador do conteúdo. Outra característica é que o
conteúdo emitido pela TV atinge simultaneamente todos os
telespectadores, e desse modo a chance de desagradar algumas pessoas é
maior do que no caso das redes sociais (discutiremos mais adiante),
sendo consequência disto um certo controle do conteúdo pela média do
feedback fornecido pelos telespectadores. A mídia poderia, por exemplo,
distorcer algumas notícias, mas não ao ponto de perder audiência, caso
haja um descontentamento por parte do telespectador a retroação será
sobre o conteúdo emitido.
No caso das redes sociais a questão difere drasticamente. O primeiro
passo é entender que as redes sociais não são emissoras, ou seja, elas
não tem um produto audiovisual que se modifica em função da audiência, o
seu produto é mais sutil, ele é condição tanto para a emissão quanto
para a recepção do conteúdo, seus usuários são "emissoras" e "audiência"
ao mesmo tempo. Entende-se, então, que as redes sociais na verdade
fornecem um meio, seu produto é uma ferramenta que se modifica pela
eficácia e eficiência em seu uso, o Facebook, por exemplo, está sempre
realizando modificações a fim de ser mais útil ao usuário. O usuário
caso se rebele não será quanto ao conteúdo recebido, como nas mídias
tradicionais, mas sim quanto ao uso da ferramenta. É a combinação do
fato de as redes sociais terem como produtos ferramentas e estas
ferramentas serem basicamente de interação que leva ao problema, sendo
que ele se constituiu da seguinte forma: a rede social precisa que sua
ferramenta seja de uso eficaz por parte do usuário e este será eficaz no
uso somente quando tiver sucesso na sua emissão de conteúdo e na
recepção de conteúdo, dessa forma as redes sociais acabam modelando seu
produto de forma com que você seja sempre eficaz nas suas interações (o
que difere da vida fora da rede), mesmo que para isso ela o engane
exercendo um controle muito mais sutil. A ferramenta condiciona o homem.
Porém que controle é esse, como ela condiciona as pessoas e quais as
consequências disso?
O controle tem por base o reforço imediato dependente do emitir e do
receber, por exemplo, quando uma pessoa envia uma mensagem em um grupo
de WhatsApp e rapidamente tem como feedback do grupo mensagens de
apoio, concordância, incentivos e etc. a probabilidade de ela enviar no
futuro novas mensagens do tipo aumentam. Um importante efeito disso será
que o feedback do grupo será sempre no sentido de receber mensagens do
mesmo tipo, criando com isso redes de interação chamadas de bolhas
ideológicas. Nelas haverá sempre uma baixa variabilidade no repertório
de seus integrantes, sendo que qualquer coisa que fuja de uma
estimulação positiva será punida por mensagens de discordância ou
facilmente excluídas do grupo. O único requerimento para participar do
grupo será o de concordar com ele, fazer rir para poder rir.
Atualmente há muitas bolhas ideológicas, sendo que até mesmo algumas
ferramentas criam mecanismo para garanti-las, os algoritmos do Facebook
garantem a eficácia da emissão selecionando previamente quem verá as
postagens e garantam a boa recepção do conteúdo selecionando previamente
a quem será emitido.
A grande sacada da campanha de Bolsonaro foi a de ter se aproveitado das
características das bolhas ideológicas. Os grupos de WhatsApp, por
exemplo, são bem representativos do que seriam as bolhas. Cada grupo
pode ter até 256 integrantes, estes podem ser de qualquer lugar do país e
ter como apoio qualquer tema, por exemplo, porte de armas, antipetismo,
parada hétero entre outros. Sua equipe e apoiadores ao disseminar
conteúdo nesses grupos fazem com que fragmentos da imagem do candidado
circulem somente pelas bolhas onde seja vantajoso circular, sendo assim
Bolsonaro não tem o risco de desagradar seus eleitores mostrando
qualquer coisa que desagrade o grupo específico. Talvez seja por isso
que o candidato se recuse a participar dos debates, há o risco de
apresentar suas facetas de uma só vez. A bolha terá o funcionamento já
citado, seus membros terão baixa variabilidade no repertório e devido a
um condicionamento diferencial passarão a se comportar de modo
característico ao do grupo, este modo se caracterizará pela falta de
debate e a exclusão imediata do que indica a posição oposta. Além do já
dito, entende-se também o motivo de Eduardo Bolsonaro ter sido eleito
com tantos votos, sua estratégia foi criar bolhas sobre temas
específicos reunindo pessoas que antes eram incomunicáveis entre si,
conseguindo um aumento de votos de 130% em relação a candidatura de
2014.
Embora não exista tantos dados a respeito do tema, procurei reunir um
conjunto de forma um tanto rudimentar, mas que já oferecem alguns
indícios.
Hoje o Brasil tem 147 milhões de pessoas aptas a votarem, 117.364.560 (79,67%) foram às urnas no primeiro turno, Bolsonaro
teve 49.276.990 (46,06%) dos votos válidos. A questão é que 81% dos
eleitores de Bolsonaro são usuários de alguma rede e se levarmos em
conta seus votos válidos serão cerca de 39.914.361 de seus eleitores.
Desses 39 milhões 57% leem notícias pelo WhatsApp, cerca de 22.751.186
de seus eleitores, 61% leem pelo Facebook, cerca de 24.347.760 pessoas. O
número de eleitores de Bolsonaro que compartilham notícias pelo
Facebook é de 12.373.475 (31%), já pelo WhatsApp é de 15.967.744. Nenhum
candidato chega ao mesmo número de pessoas, Haddad tem, por exemplo,
apenas 59% de seus eleitores fazendo uso das redes, lembrando que seu
número de eleitores é muito menor que o de Bolsonaro. Outra questão
também são as fake news, uma pesquisa realizada pela veja mostrou que
67% das que se referiam ao candidato eram positivas, 22% negativas e 11%
neutras, sendo que nenhum dos outros candidatos tiveram o número de
positivas maior do que as negativas.
Creio que o mais importante seja notar como que as redes mudaram a
qualidade das nossas interações e como os candidatos tanto de esquerda
quanto de direita - atualmente mais de direita - estão e continuarão
tirando proveito de tudo isso.
*O texto é de um Blog de um amigo, analista do comportamento, contêm coisas de análise do comportamento, política, poesias, textos reflexivos, etc.
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