31 de agosto de 2015

Tudo o quanto deseja ser II

poesia estrela cadente
vê se acredita
na prece
de toda a gente;
não esquece
daquilo que irrita
a rima que evita
a rima que não veio:
vida pela metade
é
poema escrito ao meio.

Poesia que sem asa voa,
milagre corriqueiro:
quase ninguém nota,

venha que estou à toa
rindo do mundo inteiro:
pois a Terra dá sua volta.

30 de agosto de 2015

Tudo o quanto deseja ser

Poesia é tempo novo
tudo o quanto não sei
tanto quando não fiz,
mas sou e não me dissolvo
naquele verbo de lei,
sendo quem sou
serei feliz.

Poesia esta avenida
que não passo carro,
quem deixa de ser a si mesmo
ou deixa de viver a vida
no fim, paga caro.

Poesia é frio na pele
fogueira alguma esquenta,
que o ser, se revele,
mesmo depois dos noventa.

Poesia que há de ser
ou
poesia que arde o Ser?


29 de agosto de 2015

Arrivista

Vendo meu ponto de vista
para quem quiser comprar
não cobro um só centavo
por que a demora para levar?

Vendo meu ponto de vista
ele não quer me ver,
faz birra, chora sempre,
me pede para que não insista
na ideias prontas.

Vendo meu ponto de vista
pago para ver
alguém que nisso invista.
Só não aceito cheque fundo
de falso positivista.
Nem de ativista.

Vendo meu ponto de vista
mas quero alguém que resista
e insista no que acredita,
quero uma poesia que descreva
que se fira que se atreva
a ser detalhista.

Não quero ser assim,
arrivista.

28 de agosto de 2015

Poesia quando nasça, crie sua própria asa!

Poesia quando nasce
espalha verbos pelo chão,
o sujeito quando vê
diz quem os outros são.

Poesia quando comum
que todo mundo gosta
não levará a lugar algum
será sempre a mesma crosta,
o mesmo zumzumzum.

Poesia quando triste
começa a criticar
tudo quanto existe,
poesia quando feliz
só sabe escrever
do próprio nariz.

Poesia quando nasce
espalha ideias pelo chão,
o escritor se dá conta
que escrever é um problemão.

Mas, verdade seja dita:
verso novo é verso que repita
tudo o que já foi escrito
de um jeito mais bonito.

27 de agosto de 2015

Ao persistirem os sintomas a poesia deverá ser consultada...

Na pressa mantenha a calma
tenha ao lado paciência e alma
se dinheiro é tão importante
comerás dólares de agora em diante.

Leia a bula antes de tomar o remédio:
divirta-se se a doença real for tédio,
silencie se for câncer espiritual
deixe-se estar, só.

Contorne a rotina, crie hábitos.
Misture as ilustres teorias
com os mais delicados atos,
seja o dono do seu duro ego
ver demais pode nos deixar cego.

Se ainda não for suficiente
repita a dose!
Mude, a beleza é saber ser
metamorfose!

(Esse medicamento é contraindicado em caso de suspeita de personalidade múltipla).

26 de agosto de 2015

A rosa que não mais do povo

A rosa que ninguém viu
que passou despercebida
secou, secou, secou o rio
secou o ramo da vida;
chorou e sozinho chorou
o ancião acostumado com o sabiá,
que os outros não sabiam, não notavam,
mas sempre esteve por lá.

A rosa que deu lugar
ao capim. Selvagem capim,
agora a rosa morreu
e com ela o ancião,
no laudo médico não constava
mas sei que se esvaiu
por "falta de poesia
nesse indomável coração".

Há quem nasça todos os dias
com a natureza.
Há quem morra cada vez mais
porque a natureza também morre.

25 de agosto de 2015

A maça

As estrelas sob teu corpo
saltavam iluminando
a delicadeza dos seus lábios.

Seus olhos não encontrei
(melhor assim)
por conta do embaraço
meu e do teu cabelo.
Mas teu pescoço, ah...

O manto levemente decaído
levava-me ao fascínio, delírio
das margens dos teus montes
e eu pecava em imaginar
além do meu alcance
as curvas rigorosamente
nuas.

As estrelas sob teu corpo
atraiam meus olhos, traiam
olhares demais.

24 de agosto de 2015

Drummond onde estiver

drummondianos;
aquele rosto desolado
duma profundidade sem par
aqueles olhos
mirando as pernas que
                                   passam,
aquela pedra que no caminho
insistia.

Ah, Drummond,
a rosa que entregue
ao povo se torna espinho.
As multidões mutiladas
pelo medo do dizer.

drummondianos,
a pedra no caminho
é o caminho.

23 de agosto de 2015

Tatame

Caminho suave
da escuridão
quem puder
se salve então.

Caminho suave
voar livre
sem nenhum entrave.

Caminho suave
evitar o que não leva a nada.

Caminho suave
o mais doloroso.

Suave caminho
mas sei
não sigo sozinho.

22 de agosto de 2015

Infortúnio dos poetas I

O nevoeiro não se dispersa
do vapor reflexivo que a lucidez condena.
Nenhuma ambição a não ser embolorar
gozar do meu descanso,
lançar a sorte sem nenhum dado.

Quem se entrega ao júbilo do amor
em dias que os santos jogam a sorte?
Quem se entrega ao júbilo do amor
em noites que as damas se resguardam?
Quem se submete aos perigosos, riscos
que nenhum poeta pretende cruzar?

Não há ternura nem entusiasmo
na neblina dos ociosos, morrem
os versos que de amor foram feitos,
nenhum apreço.

O nevoeiro não se dispersa
a vida sim, ninguém nega, não,
quem mirando a neblina negaria?

Canção para escutar e esculpir

Música: Tribos e Tribunais
Banda: Engenheiros do Hawaíi
Ano: 1988
Álbum: Ouça o que eu digo, não ouça ninguém
Link para audição: https://www.youtube.com/watch?v=As3TeTjD9sI

"Hindus, industriais
Tribos e tribunais
Pessoas que nunca aparecem
Ou aparecem demais"

Meta

Sopra-me o vento
frio haikai na pele
no cerne do pensamento.

Cospe-me a normalidade
o sensível e o sensitivo.
Por pouco me sinto vivo.

Surtam-me os carros
que rasgam o tempo
e atropelam pássaros.

Anima-me o ócio
o café, o sorriso:
a vida é mais que negócio.

A meta é seguir
ir para o lado do haikai
por mais que não se saiba
para onde segue, para aonde e para onde vai...

21 de agosto de 2015

Entre-linhas II

Entrelinhas cheias
entre     linhas espaço
verdades que meias
fazem-me palhaço.

Num haikai o céu
se reveste travestido
de obscuro réu
azul todo temido,

estrelas escrevem arte
forjam-a de propaganda
por qualquer parte
a mentira é quem manda,

Na realidade trágica
entre linhas tragam
escrevem e rasgam
nossa vida sádica.

Aqueles que forem vistos
lendo as margens e os cantos
viverão não como santos
mas como sujeitos ilícitos.

Aqueles que naufragarem
e tragarem o silêncio das palavras
morrerão de Averbação!

20 de agosto de 2015

O ciclo da vida

Aquele bafo de café logo cedo
as remelas nos olhos semi-abertos
os postes brilhando
como se não houvessem estrelas.

Ouço. A queda do jornal,
ecoando livremente e secamente ao chão
as notícias semi-iguais
daquele ontem que quase
não mais.

Os colunistas e escritores
ruminam o mesmo contorno,
faço o mesmo em torno
de outras palavras e horrores.

Nem TV ligada nem
celular na minha frente
a essa hora da madrugada
sou andarilho, indigente.

19 de agosto de 2015

Como canta a poesia II

Como canta a poesia
inebria meu pensamento
com fatos que não existem.

Toda realidade é tosca
repito que é tosca e surreal
tosca tão tosca tão chula.

Fetiches humanos por toda parte
por toda arte, todo Sartre e Kierkegaard,
o desespero consome a alma
que questiono a existência.

Como canta a poesia
nada é. Tudo parece ser.
Por isso tanta virtualidade,
tanto anonimato, tanto heroísmo!

Como canta a poesia
trovando sozinha seus ideais
ideias demais, ai e ais.

Somos todos loucos!
A loucura é comum,
se natural não sei dizer.

Sei que sendo o que somos
ou forjando a realidade
como canta a poesia
a terra há de comer.

18 de agosto de 2015

Como canta a poesia

absurdamente
pre
visível
surdamente na mente,
aquele abstrato discreto
na verdade
é puro concreto
decreto
poético e cético.


Há algo ainda mais esquisito
que a criatura humana?
Sei que corriqueiramente sinto
que é culpa da minha mente insana:

Imaginar esse espaço
como algo decente,

questão que resolvo fácil
traçando grosso traço
no que vejo em frente.

Criar um mundo cheio de delírios e fantasia:
as vezes as coisas se parecem como canta a poesia.


17 de agosto de 2015

Toda-via

Tudo pode ser
acontece de repente
acaso que manda
nesse mar de gente
quase tudo anda
do jeito que deve.

Quem quer realiza
calando as linhas
as palavras dos outros
e também as minhas.

Tudo pode vir
e ir para onde quiser.

Pode ser que seja acaso
pressa, presa ou atraso,
sei que toda via
pode ser também
todavia.

E tudo e tanto
pode ser
'no entanto'.

16 de agosto de 2015

Canção para uma noite de Sol

Música: Nuvem
Banda: Engenheiros do Hawaii
Álbum: Minuano (pouco conhecido, de 1997, puta álbum!)
Para ser escutada: https://www.youtube.com/watch?v=g2EmNp7SfWo

Ode aos trovadores!

Ah! Que Cupido infeliz seja
por tua eterna alegria
metamorfoseada em tristeza!

Que suas preces pereçam no âmago da solidão,
magoaste com tua flecha, meu desolado coração!

Trazei Ceres e Afrodite
recusarei firme tuas risadas.
Dai-me as ninfas dos campos
e serei pior que Erisichton!

Oh poderoso Pã!
Me abençoai com vossa loucura,
Dai-me a mente sã
nunca anestesiada pelos amores
enraizada somente da cura
de ser um homem comum.

Seguindo sempre a constelação de Baco
hei de erguer-me e navegar tranquilamente
esse navio, essa nau, esse barco.

Ah! Como queria não ter tido asas
e, egoísta, voar risonho todos os dias,
no ápice cair, tombo mortal.
Mas, sequer tive Dédalo para aconselhar-me,
não tive Atlas para manter-me convicto,
não, apenas Eros e seu ego juvenil.

Admirável mundo novo

O ignorante
que se entenda
com o ínscio.

Radiante
se prenda
no seu vício.

Desde o início
direi:
cada um é o que quer ser
aprende quem quer aprender.

15 de agosto de 2015

Dinamite

Quero explodir a dinamite
no ego do universo,
quero eliminar o que existe
deixar nada de verso,
nem pequeno que seja
até que ninguém veja
nadica de nada.

Quero, querer basta
não preciso satisfazer
tudo o que o querer alastra.

Quero e quem não quer
dizer o que a boca quiser
ser o que der e vier
e se for nada, perfeito!
É ai que levanto e deito
no ócio contemplativo.

14 de agosto de 2015

Olhos negros

A que olhos tantos rostos
que não me olham
e se me olham
não enxergam nada
nem na rosa ao lado
nem no livro aberto.

A que olhos tantos nadas
tão cheios de si mesmos,
meu ego tão inflado
tão cego e romanesco.

A que olho tantos olhos
que na avenida se perdem
e perdem-se esbugalhados
saltando pela janela do carro.

A que olho tantos espantos
e prantos que movem palavras,
o silêncio dos medrosos
a que olho não sei.

13 de agosto de 2015

A par da teoria

Ai de mim
se tudo que se escreve
terminar assim;
a que serve
deixar apenas escrito
tornaria religião
esse meu canhoto rito.

Escritor não é isso
escrever e ser omisso
(não que eu seja de fato)
tem que ser na prática
mesmo que torta.

Ai de mim
se cravo rosa
plantando jasmim.

Ai de mim, e de vocês
leitores cansados
de ruminações.

12 de agosto de 2015

Inocência II

Parece só o que se mostra

mas não é assim

que faz pérola a ostra...

11 de agosto de 2015

Inocência

Na face oculta da inocência

quem olhar se surpreende

com o tanto que vende

essa antiga ciência.


10 de agosto de 2015

Imperativo II

Quando falam representam

aquilo que querem impor,

quando calam se ausentam

deflora a fera da flor.

9 de agosto de 2015

Imperativo

Toda voz é ordem
um mandado de apreensão
que quem escuta
muitas vezes
só devora a solidão.

8 de agosto de 2015

Flor da Noite

vem, flor da noite, vem
ver as coisas da manhã
as coisas que se escondem
sobre a luz solar, vem.

venga y mire la calle
hablando locuras y dolor
cosas que solamente se encuentran
acá, acá.

Venha, chore celeste
seus raios que banham
o martírio da vida,
fardo obscuro.

7 de agosto de 2015

As razões

Poeta! Ai, poeta,
que drama!

Até rindo
seus lábios
tremem

fantasiosos
incrédulos
felizes

mas
     desen
            canto
 geral

6 de agosto de 2015

pastel de vento

Se não andasse por ai
com a cabeça ao vento
seria tão nulo
quanto a areia no deserto,
seria tão vago
que a vontade de ser
seria palha-seca.

Se não andasse por ai
com os pássaros e folgas
morreria comum,
morreria raso ou cheio
de ser tão nada
tão meio.

Como uma rosa
para uma vaca
que efeito?
devorado como se fosse
doce capim.

5 de agosto de 2015

Flutuar

Tem algo que quer sair
lá de dentro do peito
parece querer voar
qualquer lado, qualquer jeito,
parece cócegas cega
que a poesia nega
gostar.

Tem algo que quer querer
toda coisa que existe
todo nada, todo mundo
todo rei e vagabundo
quer ser
superfície e fundo
alma e corpo.

Flutuar
ser então
luar.

4 de agosto de 2015

Semblante escrito

Meu semblante
riu daquele amanhã
riu daquele ontem
riu daquele verso.

Passou
e ele continuou rindo
indo na gargalhada,
leu alguns autores
que estavam solitários com suas paixões.

E de repente, balançou.
Numa pergunta boba:
Qual tipo quando escrevo
não sou?

Assim foi, e não foi nada,
meu semblante segue
por mais que negue as notas
negras, obscuras.

De beleza sem fim.

3 de agosto de 2015

No olhar do olhar

Rosto morto
que olho na cama
a vontade de viver
no reflexo do espelho,
não é drama
não olhe torto
nem queira ver
meu único conselho.

Rosto vivo
que a cama observa
a morte tão viva
que o alarme desperta,
tão persuasivo
mas, se enerva,
expressão compassiva
escrevendo errado
a coisa certa.

2 de agosto de 2015

Prosear-te, prosa é arte.

Quero o silêncio
quando o tenho
pareço fugir.

Não existe verso
que não procure rima
em outro verso.

Mas, no entanto, que prosa
deve conversar com a minha
se ela quer que quer
ficar sozinha?

1 de agosto de 2015

Meu maior segredo

Direi, mas não conte a ninguém

é segredo, é secreto, é obscuro

não conte a ninguém, eu juro:


eu que era cheio

de palavras estou sem.