25 de setembro de 2016

Outros versinhos


Teu abraço, dona ruiva,
teu riso, tua graça.
Teu olhar, tua curva,
observo, enquanto passa.

Teu jeito simples,
para meu espanto
veio duma só vez
com est'teu encanto.

24 de setembro de 2016

Repara, para, se preciso.



Repara bem, nas coisas que acontecem
nas coisas, não nomeadas, nos olhos
e nos olhares que buscam apenas sorrisos,
ou naqueles que deprimidos se encontram.

E repara bem. Repara muito bem,
nas repetições do cotidiano, perigosas,
alimentando o silêncio que tão profundo
vai carregando, feito escravo, nosso mundo.

E... e repara bem. Repara sim
não finja que não vê estes problemas.
Repara bem no que prefere não reparar.
Repara que quando a vida repete
falta rima, falta verso, falta ar.

Repara bem, separa bem
joio do trigo.
Mas não para fazer do joio
teu melhor amigo.

22 de setembro de 2016

Orelha Vulcânica III



Dizem de liberdade.
Dizem de prática libertadora.
Dizem de livre-arbítrio.
Dizem de Indeterminismo.
Dizem, apenas dizem,
é mais fácil dizer que
todo mundo escolhe.

E por que dizem assim?
Ah... essa sociedade coercitiva,
sempre servindo aos seus senhores,
aos seus deuses personificados ou não.

Animal, como outro qualquer,
encantador, como essa vida toda.
Não basta estar vivo e ver que a vida
é tão profunda
que acrescentar algo mais
é menosprezar o próprio Existir?
Apenas retardamos a possibilidade
de um amanhã melhor do que esse hoje.

Dizem que o pobre é assim porque quer.
Dizem que quem tem depressão está assim porque quer.
E não dá, em definitivo, ainda que isso seja apenas poesia,
para resolvermos nossos problemas ou entender os outros
enquanto acharmos que as pessoas sofrem porque se intencionam
a sofrer.
Enquanto dizermos que o drogado se droga porque quer ou
porque escolheu se drogar.

E há quem insista,
há quem bata palma,
há quem escute sem criticar,
há quem repita

bobagens, bobagens, bobagens,

E nestes versos nada versados
deposito as falácias das quais
alguns já estão cansados, cansados.

21 de setembro de 2016

Orelha Vulcânica II


O ouvido chega a lacrimejar.
Os olhos preferem a cegueira:
não mais aguentam a tortura
interpretativa e circular do autor.

Termos difíceis, mas grosseiros,
contraditórios, autossuficientes.
Num momento tenho a impressão
do autor não ter lido o que escreveu,
como se consultasse um dicionário de rimas
sem qualquer função, para parecer bonito.

Há loucos ao meu lado acenando
felizes com o que leram, felizes e tão felizes.
Será que sou eu o louco por questionar?
Não me explicaram as regras deste jogo maldito,
mas compreendo...
É até mesmo razoável que não queiram duvidar.
É até mesmo razoável que não argumentem,
se tudo não passa de "opinião", e as críticas, que são?
Bem... dizem ser "inquietações".

Em seguida, me levanto, pois começam
a falar sobre os problemas da educação.
Não sei se é ironia.
Se for, é de péssimo gosto.

20 de setembro de 2016

Orelha vulcânica


Desdenho:
Retórica resplandecente
enaltecida na erupção contagiante
de obras dialéticas e sorrisos pós-modernistas
que fazem qualquer religião sentir inveja,
tamanha a inovação do inferno "científico".

Menosprezo:
Discursos contraditórios que permanecem
somente pela natureza do encanto
causado nos sedentos de sentido e semelhança
do homem à imagem celestial.

A quem me diga do próprio feitio destes versos
que tanto dizem e pouco explicam,
me refiro ao charlatanismo charlatanesco
redundante como o verso anterior,
que enfeita o ambiente educacional:

finja, pois, que compreende meus poemas.
Finjo, pois, que compreendo tua interpretação,
e assim criamos uma dinâmica harmoniosa,
sem críticas que levariam a dúvidas desastrosas.

Estupidez é inovação (?)

17 de setembro de 2016

Tan lejos ..


Morena:
de saudade é feita.

E feita de sorrisos
aos quais nenhum esqueço.
E feita de rimas
tão simples, tão simples,
como a lua, como a vida.

Morena:
de poesia é feita.
Se depender de verso
a gente se refaz
a gente se ajeita.

De saudade é feita
de sonhos não só sonhados.
De saudade é feita,
de poesia
tão simples, tão simples,
que fico até repetitivo.

13 de setembro de 2016

O insensível


Eis minha arte moderna:

palavra, pentelho,
revira, dor, baderna.

Tirando da cartola
o belo coelho
algum crítico

por certo
ou reescreve o místico
aplaudindo a inovação,
ou questiona
o seco deserto
de minha imaginação.

Eis assim a arte moderna
obra sem nenhum sentido
sem braço, corpo, perna,

nessa semiótica
vazia e neurótica.

12 de setembro de 2016

Título, não sei qual


O ponto final não deveria existir
na poesia.
É mera formalidade dos poetas
para com os leitores.
Não há um fim, há um ciclo.
As vezes lastimável e denso
de espinhos crueis, das rosas miragens.

O ponto final veio da vida.
E isso aqui, meu bem, acaba.

Ainda bem que acaba, ainda
que alguns insistem em dizer
que daqui se vai para outra melhor
ou pior.
Isso é tudo. Depois, como escuto
numa canção do Lenine,
é só carbono. E as dúvidas se vão,
nessa certeza desesperadora
para alguns
e reconfortante para poucos,
seguindo o tal

ponto final

9 de setembro de 2016

Noites infernais

-Resposta ao blog do Azarão:

Há noites em que os poetas minguam:
a Lua, a cerveja e a tristeza, abundam.
São noites que se criam antologias infernais.

Há noites que de nós não se desligam:
e os dias passam, em absoluto, não mudam.
E noites vagabundas que deveriam durar mais.

Não há noites, se lá fora só há prédio.
Não há noites: há postes acessos,
dores, guerras, crianças que choram, tédio.

Não há condescendências:
há apenas dias,
e noites são apenas, aparências.

 


Poesia rasgada



Dos trapos
um novo remendo,
e de costura
tampouco entendo,
a esta altura
tudo uma loucura
tomando outra surra
dos meus sentimentos.

8 de setembro de 2016

Versos na sarjeta



O problema desses poemas
é que após escritos, são massacrados
ou por críticas, ou pelas mãos que os compõem.
Ou ainda:
esquecidos, jogados na fogueira, abandonados em cafeterias
junto com guardanapos sujos.

Mas o problema mesmo
é quando isso ocorre

com quem os escreve.

4 de setembro de 2016

Pr'aquela morena


Se me chamares, irei,
pois sei que tu rumo não tens
e não te importas
se sou da plebe
ou
homem da lei.
Se me chamares
vou.
Pois não te importa meus bens
e sei que
se te chamo
vens,

ainda que toda cheia
de poréns,

pois sabes que sim
e que minha poesia
pra ti não tem fim

(a não ser esta, que termina
e termina assim:
curta, breve e simples
como deve (não) ser
a mais bela obra prima)

3 de setembro de 2016

Sobrevivência


As palavras, elas também
lutam pela existência
nessa corrida armamentista da linguagem.
Fico eu, em parte aquém
observando a incoerência
do que dizem por aí
mas as vezes aceno, por camaradagem.

As palavras, dominantes
dominadas, de-formadas,
não do barro,
mas do chumbo do poeta,
casca grossa que vive torto
e errando até o erro acerta.
Deste vocabulário solto
que faz brotar ilusão,
derivo a obra prima
sem inferir a intenção.
Diz que é pelo prisma
que o olhar sobrevive,
pois diga o que quiser
apenas da poesia
não me prive.

As palavras, elas também somem
e refazem parte de si.
Sei que as pessoas dizem
ter lido algo que não escrevi.

 

2 de setembro de 2016

Respingo de Café Filosófico (II)

-Poesia sobre o "Nada", ou quase isso


Sobre o Nada,
pura tolice.
Sempre há algo.

Pura piada
dizer que do nada
algo se torna,
fica até vazia
essa minha poesia.

O nada
"é" inconcebível,
e só passa de sabido
o esperto que afirma
o Nada
de forma "inteligível".

Retórica pobre
forjada na pele
de algo nobre.

Estudar o nada
é esperar que só do Nada
o Nada se forma.

Inutilidade.
Mas vale questionar o contrário,
se nada vem do nada
de onde veio tudo isso?
(E esperar alguém dizendo
"é tudo apenas imaginário"
não passa do doloroso início).

Daí pode-se questionar
se tudo sempre esteve
neste inevitável existir,
ou se foram os filhos de Borr
que criaram, ao matar Ymir.


1 de setembro de 2016

Respingo de Café Filosófico (I)

-Poesia-crítica sobre o conceito de "Significado",


Dizem:

"Eis na poesia o Significado,
que surge espontâneo
que surge na palavra, desenhado,
como se nos verbos
dores e amores vivessem,
eis meu entender contemporâneo".

Dizem outros mais:

"Escrevo. O Significado
no fundo do inconsciente,
atua no ego, atua na mente,
e se manifesta divino
ao objeto direcionado".

Dizem, ainda:

"A resposta está na Semiótica,
na arte dos sinais e signos.
E vendo, pela minha ótica
este autor tem verbos malignos".

Meu caro leitor
ao que pouco escrevo
o verbo tem valor
mas criticar me atrevo.
Significado não tem perna
Significado não mora
Significado, se não explicado
a poesia devora
a ciência hiberna.

E para tu leitor,
como explicar o "Significado"
do que é dito?

Só sei que me limito
a dizer que está nas
contingências.

E que dizer do infinito
ou sobre o nada,
não passa de aparências.