4 de março de 2016

Observação de um dia estranho, bem estranho.

Quando te vejo falar, apenas te olho, concordo, aceno a cabeça,
mas antes que eu me esqueça, preciso dizer que nada escuto.
Observo teus lábios. Sinto teu aroma. Tento identificar a sonoridade
da tua voz. Danço mentalmente a música que sai da tuas cordas vocais.
Além, fixo minha atenção nas tuas mais breves expressões.
E são tantas! Noto e conoto, da mesma forma, teus gestos rápidos
e sutis. Sua sobrancelha que se ergue e decai, levemente.
Sua mão não possui nenhuma aliança, seus seios se direcionam, suaves,
cada qual para um canto, mas mantendo sempre a alienação ao centro.
Teu cabelo, um pouco ao ar e um pouco preso, quase lhe súplica mais liberdade,
no mais, sois encanto. És a união entre o Sol e a Lua, e sabes bem.
O que mais posso abstrair, enquanto tu ainda falas serelepe?

És arte, sem sombra de dúvida. Mas uma arte pouco apolínea,
tua alma não quer, de maneira alguma, esconder o mundo terrível
que se apresenta aos nossos. Gostas, ao que indica tua vestimenta,
de fantasiar a realidade sem que dela se desprenda.
Teu rosto, que se contorce na graça do teu sorriso, transpassa o dionisíaco,
o nu e cru da nossa essência. Queres viver! Queres gozar! Queres sentir
e não somente o amor. Beiras o masoquismo, pelo que posso presenciar.
(E quem não?)

Imagino, enquanto ainda falas, as vertentes cabíveis quando teu silêncio surgir.
Ignorei, e muito bem, sem que percebas, toda a necessidade do ato de escutar.
Apenas acenando, com movimento intercalados, a cabeça, posso garantir de que concordo.

Quando menos percebo, estamos a rir, a gargalhar.
Perdemos a noção de tempo,
perdemos a noção de espaço. Acordamos um do lado do outro,
na mesma cama, no dia seguinte.
Será que estou ficando louco? Pouco me recordo do que se passou
depois de que saímos daquela cafeteria.
Uma sensação de fascínio mista a uma sensação de agonia me atinge.
Dizes a mim que a noite se passou tão rápida, mas, encantadora.
Concordo, dizendo que sim. Me visto. Jogo uma água no corpo magricelo.
Ainda assim, não me lembro dos detalhes daquela noite, tampouco
de como fomos chegar ao quarto.

Que demônio é esse que toma minha consciência e me rouba o melhor do dia?
Que demônio é esse que se aproveita do sexo e do sono, dignados a mim?


Outro dia, outra cafeteria, mesma mulher, um tanto ainda desconhecida:
quando te vejo falar, apenas te olho, concordo, aceno a cabeça,
mas dessa vez ficarei atento...
 
 
 

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